Redatora de saúde e bem-estar, autora de reportagens sobre alimentação, família e estilo de vida.
A ciência deu uma guinada inesperada na compreensão de como o sexo biológico é determinado no nascimento. Tradicionalmente, acreditava-se que os cromossomos sexuais — XX para mulheres e XY para homens — eram os responsáveis por definir o desenvolvimento dos traços masculinos ou femininos.
No entanto, uma equipe de cientistas chineses do Hospital Reprodutivo e Genético Citic-Xiangya está desafiando essa ideia com uma teoria revolucionária: os cromossomos XX ou XY não determinam o sexo do indivíduo, ao menos não no nível celular comum, segundo informações do South China Morning Post.
Quimerismo: a teoria genética que redefine o sexo ao nascer
Para compreender esse caso, é preciso entender o conceito de quimerismo. O quimerismo é um fenômeno genético no qual um indivíduo se forma a partir da fusão de dois zigotos, cada um com seu próprio código genético. Essa condição resulta em um organismo com dois conjuntos distintos de células geneticamente diferentes, como se tivesse o DNA de duas pessoas em um único corpo.
O caso que colocou em xeque a teoria predominante envolve um paciente com quimerismo somático, uma condição extremamente rara em que coexistem células com cromossomos sexuais XX e XY.
Apesar de apresentar características físicas femininas, a análise dos tecidos dessa paciente de 30 anos revelou uma mistura de células XX e XY, inclusive nos ovários, responsáveis pela produção dos hormônios femininos. Ou seja, não se trata de um organismo com 100% de cromossomos XX (femininos) ou XY (masculinos).
No entanto, isso não significa que uma pessoa com quimerismo não tenha um sexo definido, mas sim que seu organismo possui uma mistura de células com diferentes cromossomos. Essa condição pode ainda acarretar desafios legais para quem a possui.
O aspecto mais surpreendente foi a descoberta de que, embora alguns folículos ovarianos fossem compostos inteiramente por células XY, todos os óvulos analisados apresentavam apenas sinais do cromossomo X. Isso sugere que as células germinativas — precursoras das células reprodutivas — podem desempenhar um papel mais importante na determinação do sexo do que se pensava anteriormente.
O papel das células no quimerismo somático e na identidade sexual
Essa descoberta abre espaço para uma diversidade de fenótipos sexuais em pessoas com quimerismo somático, que vão desde características claramente masculinas ou femininas até intersexo — isto é, a presença simultânea de tecido ovariano e testicular em um mesmo indivíduo.
As pesquisas atuais sugerem que a coexistência de células XX e XY nas gônadas pode resultar em ovotestis, uma mistura de tecido ovariano e testicular. Porém, isso não explica completamente como pacientes com quimerismo somático podem apresentar gônadas normais, ou seja, órgãos sexuais típicos de um sexo definido, seja masculino ou feminino.
Diante dessa dúvida, os pesquisadores especulam que as primeiras células a migrarem para a crista genital — precursor das gônadas — poderiam ser de origem XX, influenciando assim a determinação do sexo, independentemente da predominância dos cromossomos XX ou XY.
Embora esse estudo ofereça uma perspectiva intrigante, são necessárias mais pesquisas para compreender completamente os mecanismos por trás dessa teoria, pois ela se baseia na observação de um único paciente, não de uma amostra maior.
Este estudo sugere que, com pesquisas mais aprofundadas e dados adicionais, poderemos transformar nossa compreensão atual sobre identidade de gênero e biologia reprodutiva.
A ideia de que o sexo de um ser vivo é definido exclusivamente pela presença de cromossomos sexuais específicos — XX para mulheres e XY para homens — pode não ser necessariamente verdadeira. Um indivíduo pode apresentar órgãos sexuais típicos de um sexo ou outro, independentemente da contagem cromossômica, como demonstra este caso.
Saiba mais: Identidade de gênero, sexualidade e sexo: entenda os termos